quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

CAPÍTULO 40 “IDE POR TODO O MUNDO E PREGAI O

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“IDE POR TODO O MUNDO E PREGAI O
EVANGELHO A TODA CRIATURA”
(Mc 16, 15)
1. O testamento de Jesus Cristo
As últimas palavras de alguém, ainda que pronunciadas no ambiente de agitação e
debilidade da agonia, têm, para nós, um sentido de extrema seriedade. Que pensar, então,
da ordem final de Nosso Senhor aos Apóstolos, chamada a Sua última vontade, o Seu
testamento, transmitido num momento mais solene que o do Sinai – quando finalizava a
Sua missão terrena de legislador e se dispunha a subir ao céu? Revestia-O já a majestade da
Trindade augusta, enquanto ordenava: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda
criatura” (Mc 16,15).
Estas palavras são a chave do Cristianismo. A Fé deve lutar por atingir todas as
pessoas com ardor sem fim. Por vezes falta-
304
[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 305]
lhe esta característica essencial. Não se buscam as pessoas nem dentro nem fora do
rebanho. Desprezando o que Jesus falou por ocasião da Ascensão, pagamos o preço da
perda da graça, da diminuição da Fé e, se não tomarmos cuidado, poderemos até perdê-la.
Quantos já não pagaram este terrível preço?
Quando Jesus Cristo disse toda criatura, queria dizer de fato todas as pessoas.
Diante dos olhos de Jesus estavam todos e cada um em particular – “por quem se deixara
coroar de espinhos, por quem sofrera a cruz, os cravos e a lança, os olhares afrontosos da
canalha, agravos sem conta, angústias sem medida, desfalecimentos e dores agonizantes, a
própria morte no Calvário”. Tanto sofrimento não pode desperdiçar-se. Importa que o
Precioso Sangue chegue a todas as pessoas, a favor das quais foi derramado com tanta
generosidade. É este encargo recebido de Cristo que nos impele energicamente para os
homens do mundo inteiro, onde quer que se encontrem: – para os mais humildes e para os
grandes, para os de perto e os de longe, para a gente vulgar, para os mais perversos, para a
cabana mais distante, para todas as criaturas aflitas, para os tipos diabólicos, o farol mais
isolado, as Madalenas, os leprosos, os esquecidos da fortuna, as vítimas do álcool e do
vício, as classes perigosas, os habitantes das favelas e das ruas, os que se batem no campo
de batalha, os clandestinos, os lugares evitados, os destroços humanos, os antros mais
imundos, as vastidões geladas, o deserto ressecado pelo sol, os sertões mais densos, os
brejos mais sombrios, a ilha desconhecida, a tribo ainda não descoberta; para o
absolutamente desconhecido, a fim de saber se lá vive alguém; até aos pontos mais
elevados da terra, onde mora o arco-íris. Ninguém deve escapar ao nosso cuidado, para que
o meigo Jesus não nos olhe com severidade.
A Legião de Maria deve ter a obsessão desta última ordem do Senhor. Deve
procurar, como primeiro objetivo do seu apostolado, estabelecer um contato de qualquer
espécie com todas e cada uma das pessoas à sua volta em toda a parte. Se o fizer – e pode
fazer – podemos estar certos de que o mandamento do Senhor está em vias de
cumprimento.
Nosso Senhor, note-se, não ordenou que convertêssemos todas as pessoas, mas que
fôssemos ao seu encontro com a palavra da salvação. A conversão pode estar acima das
possibilidades humanas, mas o contato com as pessoas está dentro das nossas
possibilidades. Se realizarmos estes contatos indiscriminadamente com todas as
pessoas, estejamos certos de colher safra abundante. Nosso Senhor não impõe cuidados
desnecessários,
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 306]
sem alcance. Quando tivermos levado até o fim a tarefa de contatar todas as pessoas do
mundo, teremos cumprido ao menos o mandamento do Senhor, e isto é o importante. O
resultado pode muito bem ser a renovação do fogo de Pentecostes.
Muitos operários zelosos pensam satisfazer as exigências divinas a seu respeito pelo
fato de trabalharem até ao limite das próprias forças. Infelizmente o esforço isolado de um
só homem não vai longe. Deus não ficará contente com este empenho isolado, nem fará o
bem que tal pessoa deixe de tentar. É que o trabalho religioso deve ser executado como
qualquer outro que excede a capacidade individual, quer dizer, colocando em ação os
homens e organizando-os em número suficiente.
Esse esforço para unir os outros ao nosso próprio esforço é uma parte essencial da
nossa obrigação comum. Esta obrigação pertence não só às figuras mais elevadas da Igreja,
não só aos sacerdotes, mas a cada legionário e a cada católico. Quando as ondas de
apostolado brotarem com força de todos os crentes, assistiremos a um dilúvio universal.
“Haveis de achar que o vosso poder de ação iguala sempre os vossos desejos e os
vossos progressos na fé! Os favores celestes não são como os terrenos. Na recepção dos
dons de Deus não estais sujeitos a medidas ou restrições. A fonte da graça divina corre
sempre sem limitações, sem canais fixos que reprimam as águas da vida. Procuremos com
sede ardente estas águas, abramos os corações para as receber e hão de entornar-se em
nós à medida da nossa fé”. (S. Cipriano de Cartago)
2. A LEGIÃO DEVE DIRIGIR-SE A CADA PESSOA EM PARTICULAR
“Não deixemos que a multidão dos que comungam e se acotovelam ao redor do
altar na Santa Missa nos esconda uma série de contrastes horríveis: famílias inteiras em que
tudo vai mal; bairros inteiros, corrompidos e abomináveis, em que o mal domina como
senhor, rodeado da sua corte. Segundo: Nunca nos esqueçamos de que o pecado nos parece
pior e nos choca mais em tais lugares, mas é duplamente maléfico onde se apresenta
disfarçado. Terceiro: Os frutos maduros do mal revelam-se aí (os frutos pecaminosos do
Mar Morto), mas as raízes escondem-se em todos os recantos do país. Onde quer que a
negligência se
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 307]
insinue ou o pecado venial erga a cabeça aí se preparam abominações. Ao apóstolo, esteja
onde estiver, nunca falta trabalho. Mesmo que não fizesse mais do que dirigir algumas
palavras de consolo a um pobre enfermo numa enfermaria, ou ensinar duas ou três crianças
a fazerem o sinal da cruz e a balbuciarem uma resposta à pergunta: “Quem criou o
mundo?” – descarregaria um rude golpe, talvez sem disso se aperceber, sobre todas as
maquinações do mal. Quarto (e este ponto constitui uma mensagem de esperança para o
operário apostólico demasiadamente propenso a desanimar perante os males gravíssimos):
Mesmo a onda de desordens acima descrita não é incurável. Tem remédio – um remédio
único: a aplicação intensa e paciente dos meios sobrenaturais de que dispõe a Igreja.
Debaixo da crosta de depravação, cujo esboço nos horroriza, existe uma centelha de
fé, que nos melhores momentos anseia pela virtude. Surja, então, uma alma compreensiva
que acarinhe, anime, fale de coisas mais altas e infunda a esperança luminosa de que tudo
pode ser reparado, e até a vítima mais perversa poderá ser conduzida aos pés do sacerdote e
receber os Sacramentos. Recebidos estes, operou-se uma transformação espiritual, cujos
efeitos salutares nunca mais se hão de apagar por inteiro. Freqüentemente, o grande poder
de Jesus Cristo, manifestado através dos Sacramentos, é tão extraordinário que ficamos
atônitos, em face de vidas totalmente transformadas que recordam, de longe, a milagrosa
conversão de Agostinho ou de Madalena.
Para outros a cura será menos prodigiosa: a inclinação para os maus hábitos e outras
más influências do passado serão irresistíveis; as pobres vítimas hão de cair e recair para se
levantarem de novo. É provável que nunca cheguem a ser o que poderíamos chamar de
bons cidadãos; no entanto, o elemento sobrenatural influirá provavelmente o suficiente nas
suas vidas para os conduzir ao porto de salvação. O grande objetivo de todos os esforços
terá sido alcançado.
De fato, raros serão os fracassos para o legionário de fé simples e corajosa, sejam
quais forem os locais em que trabalhe, mesmo que seja nos lugares piores e mais escuros. A
norma a adotar é simples: propagai a freqüência dos Sacramentos e as devoções populares,
e o pecado desaparecerá diante de vós. Fazei bem por toda a parte e a todos edificareis;
basta romper a frente inimiga num ponto qualquer para ela ruir. Preparai as armas,
conforme as necessidades do momento. Por exemplo: Moram num prédio seis famílias
afastadas da Santa Missa e dos Sacramentos, mos-
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 308]
trando-se resistentes a todos os conselhos. Devemos insistir a fim de conseguir o mínimo de
colaboração, mesmo que seja de uma só. Procuremos fazer a Entronização do Sagrado
Coração de Jesus, e já teremos ganho uma parte da luta. Jesus fará o resto do trabalho.
Conquistando essa família, e outras lhe seguirão o exemplo. Verificareis com alegria que as
almas que mutuamente se haviam arrastado ao vício pelos maus exemplos se animarão
umas às outras, na prática da virtude” (Padre Miguel Creedon, primeiro Diretor Espiritual
do Concilium Legionis Mariae).
“Este ladrão roubou o Paraíso! Ninguém, antes dele, recebera promessa
semelhante; nem Abraão, nem Isaac, nem Jacob, nem Moisés, nem os Profetas, nem os
Apóstolos; o ladrão arrebatou o primeiro lugar. Mas a sua fé também excedeu a de todos
eles! Viu a Jesus em tormentos e adorou-O como se estivera radiosos na glória; viu-O
cravado na cruz e implorou-O como se Ele estivera assentado no trono; viu-O condenado
e rogou-lhe como a Rei. Ó admirável ladrão! Viste um homem crucificado e proclamaste-
O Deus.” (S. João Crisóstomo)
3. O ESPECIAL RELACIONAMENTO COM NOSSAS IGREJAS IRMÃS DE
TRADIÇÃO ORTODOXA
A missão de levar a mensagem de Jesus Cristo a cada pessoa que, nas palavras do
Papa Paulo VI, é “função essencial da Igreja” (EN 14), é estreitamente ligada àquele outro
grande compromisso da Igreja que é a busca de reconciliação e da unidade entre os cristãos.
Recordamos, aqui, a oração de Nosso Senhor na Última Ceia, “...que todos sejam um.
Como tu, Pai, está em mim e eu em ti, que eles estejam em nós, para que o mundo creia que
tu me enviaste”. (Jo 17, 21)
A partir do Concílio Vaticano II (1962-1965), a Unidade Cristã é uma das grandes
prioridades da Igreja Católica Apostólica Romana para os nossos tempos, porque como o
mesmo Concílio aponta: “Esta divisão, sem dúvida, contradiz abertamente a vontade de
Cristo, e se constitui em escândalo para o mundo, como também prejudica a santíssima
causa da pregação do Evangelho a toda criatura” (UR 1).
No contexto do que está escrito acima, a seguinte citação da Carta Apostólica
“Orientale Lumen” do Papa João Paulo II, escrita como ajuda para restaurar a Unidade com
todos os cristãos do Oriente, é de máxima importância:
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 309]
“Visto que, de fato, acreditamos que a veneranda e antiga tradição das Igrejas
Orientais é parte integrante do patrimônio da Igreja de Cristo, a primeira necessidade para
os católicos é conhecê-la para se poderem nutrir dela e, na maneira possível, cada um
favorecer o processo da unidade.
Os nossos irmãos orientais católicos têm viva consciência de que são portadores,
juntamente com os irmãos ortodoxos, desta tradição. É necessário que também os filhos da
Igreja Católica de tradição latina possam conhecer em plenitude este tesouro e sentir assim,
juntamente com o Papa, a paixão para que seja restituída à Igreja e ao mundo a
manifestação plena da catolicidade da Igreja, que não se exprime apenas por uma única
tradição, nem tampouco por uma comunidade contra a outra; e para que também a todos
nós seja concedido saborear plenamente aquele patrimônio divinamente revelado e indiviso
da Igreja universal que se conserva e cresce na vida tanto das Igrejas do Oriente como
naquelas do Ocidente”. (Nº 1)
Ainda sobre as Igrejas Ortodoxas o Santo Padre disse:
“Um laço particularmente estreito já nos une. Temos em comum quase tudo; e
sobretudo temos em comum o anélito sincero da unidade”. (Nº 3)
As Igrejas Ortodoxas são verdadeiramente Igrejas Irmãs. Devemos promover de
todas as maneiras possíveis a reconciliação e unidade entre nós conforme a vontade de
Cristo e conforme as orientações do documento “Unitatis Redintegratio” do Concílio
Vaticano II.
Nos próximos parágrafos deste capítulo, o que for dito em referência à conversão
daqueles que não são católicos não se refere aos nossos irmãos e irmãs das Igrejas
Ortodoxas.
4. À PROCURA DE CONVERSÕES PARA A IGREJA
“A Igreja só tem uma razão de existir”, declara solenemente Pio XI: “a extensão ao
mundo inteiro do Reinado de Cristo, para que todos os homens participem dos frutos da
Redenção”. Como é triste, pois, que os católicos vivam no meio de multidões estranhas à
Igreja e façam tão pouco ou nada para as atrair ao seio dela. Este descuido nasce, às vezes,
por nos deixarmos esmagar pelo problema da assistência ao rebanho católico, es-
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 310]
quecendo que os de fora são parte integrante do mesmo problema. Será para admirar que no
fim nem se conservem os de dentro nem se façam entrar os de fora?
Não nos criemos ilusões: temos de levar a Fé ao conhecimento do todos quantos
vivem fora da Igreja. A timidez, o respeito humano, os obstáculos, qualquer que seja sua
natureza, hão de ceder diante do desejo intenso de partilhar com quem não o possui o
inestimável tesouro da Fé. É necessário pregar o Evangelho a toda criatura. Os esforços
despendidos neste sentido devem ser semelhantes aos de um homem fora de si, no entender
de S. Francisco Xavier. Mas outros aconselharão prudência! Sim, há muita coisa
dependente desta virtude, mas dentro dos seus limites. A prudência tem o objetivo de
proteger a atividade necessária e não o objetivo de paralisá-la. Numa organização, a
prudência não pode ser considerada o motor; ela é o freio, que dever ser usado apenas
quando necessário. Alguns querem a todo o custo fazer dela a força principal da
organização e depois se espantam ao ver a falta de ação a que se chegou. Precisamos de
pessoas fora de si, que não pensem em rodear-se de cuidados exagerados, que desprezem o
medo, que não se enganem sobre a falta de prudência ou a tão comentada prudência a que
Leão XIII chamava de exageros criminosos. O tempo passa, arrastando as pessoas no
redemoinho de sua corrente violenta. Vamos em seu auxílio, pois que, se nos demorarmos,
poderemos salvar outras pessoas, mas não essas: terão sido engolidas pelo abismo da
eternidade.
“À força de repetir que as pessoas não estão dispostas a receber o Evangelho, acabase
por não estar disposto a propagá-lo” (Cardeal L. J. Suenens).
Fora da Igreja, os homens são sacudidos pelas ondas da dúvida e desejam repouso;
precisam de alguém que os esclareça e lhes aponte, na Igreja, a Fé e a calma por que
suspiram. A primeira coisa a fazer, para os convencer disto, é abordá-los pessoalmente.
Como entenderão eles a verdade, se ninguém lhes ensinar? (At 8, 30-31). Como poderão
livrar-se dos preconceitos e dúvidas sobre a religião, se nós, os católicos, permanecemos
em silêncio sobre esse assunto? Como poderão os inimigos da Igreja sentir o ardor da nossa
Fé, se exteriormente somos frios e indiferentes? Diante de uma Fé sem entusiasmo e que
transparece tão raramente, os incrédulos poderão concluir que não há diferença entre eles e
os católicos.
Há uma tendência para pensar que é suficiente lançar aos quatro ventos as
pretensões católicas através dos meios de comunicação social e de discursos em
assembléias públicas. De fato,
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 311]
porém, não é assim: a eficiência da comunicação das verdades da Fé depende do maior ou
menor contato pessoal. Se o número de conversões estivesse em proporção com o alcance
dos processos científicos modernos de publicidade, como os já citados, a época tecnológica
atual deveria ser testemunha de conversões em grande escala. Ora, a verdade dolorosa é que
custa a manter, sem perder ovelhas, o próprio rebanho católico.
Não! Para atuar com proveito sobre as pessoas é necessário abordá-las
pessoalmente, intimamente. Os meios de comunicação social poder servir para acordar os
espíritos ou apoiar uma campanha a favor do retorno das “outras ovelhas” ao rebanho do
Bom Pastor, mas o centro de todas as atividades deve ser o apelo direto de uma a outra
pessoa. Para uma pessoa elevar outra é necessário atraí-la a si; eis uma lei do mundo
espiritual, declarava Frederico Ozanam. Ou, por outras palavras: é preciso exercer a
caridade; o dom sem o doador será sempre incompleto. Católicos há, infelizmente, que se
comportam, muitas vezes, como se nada pudessem. Imaginam os de fora da Igreja
firmemente presos aos seus preconceitos e ignorância para poderem ser conquistados. Sem
dúvida que os preconceitos são numerosos, tradicionais, herdados e fortalecidos pela
educação. Com que armas, então, enfrentará o católico comum as forças organizadas da
descrença? Que não tenha medo! Na doutrina da Igreja, na sua exposição mais simples,
dispõe de uma espada fulgurante, cuja eficácia o Cardeal Newman realça em nobres
termos: “Sinto vibrar em mim, intensamente, o poder conquistador da verdade portadora da
bênção de Deus, da verdade cujo triunfo o demônio poderá retardar mas nunca impedir”.
Nunca esqueça também este outro princípio que não deve desmentir com o seu
procedimento: “A verdade, no combate com o erro, nunca se irrita. O erro, ao contrário,
nunca conserva a serenidade na luta com a verdade” (De Maistre). O acesso às pessoas,
como insistentemente temos repetido no decorrer destas páginas, tem de ser o ensinado pelo
Divino Pastor, em circunstâncias semelhantes. Nada de discussões e de orgulho. Que todas
as palavras respirem humildade, afeto e sinceridade. Em resumo: tanto as ações como as
palavras hão de mostrar-se fruto espontâneo de uma fé verdadeira. Deste modo, poucas
vezes serão mal recebidos e deixarão sempre nas pessoas uma impressão profunda que,
com freqüência, se desenvolverá em frutos de conversão.
“Devemos recordar-nos sempre”, diz Mons. Williams, antigo Arcebispo de
Birmingham, “de que a religião não se ensina,
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 312]
comunica-se. É uma chama acesa numa alma por outra alma; difunde-se apenas pelo amor.
Aceitamo-la daqueles que consideramos nossos amigos. Quem nos for indiferentes ou
parecer agressivo não venha recomendar-nos a religião”.
Dada a necessidade de contato direto, cada operário apostólico não pode encarregarse
de muitos casos. Para que as conversões se tornem numerosas, requerem-se numerosos
operários. Daí a imperiosa urgência em multiplicar os legionários.
Seja qual for o método adotado, preste-se atenção ao seguinte:
a) Dediquem-se ao estudo, não com a finalidade de mera discussão, mas para
estarem prontos a auxiliar aqueles que busquem sinceramente a verdade.
b) Velem pelos convertidos. De modo que estes se certifiquem de que são
amparados pelos seus amigos católicos, ou alistem-nos na Legião, caso reúnam as
condições exigidas. Ninguém mais capaz do que eles para resolver as dificuldades dos seus
antigos companheiros.
c) Informados por aqueles cuja especialidade é o ensino dos não-católicos, de que
alguns, tendo começado a instruir-se na religião, desanimaram, os legionários irão à sua
procura. A experiência indica que, geralmente, não é a falta de desejo de se tornarem
católicos, mas, sim, um conjunto de fatos acidentais que os levaram a interromper a
instrução; depois a timidez e o adiamento explicam as ausências.
d) As oportunidades para um contato verdadeiro com não-católicos serão
numerosas, contanto que os legionários tratem com eles naturalmente, de forma cristã. Aos
católicos cheios de dúvidas, aflitos ou perturbados, o legionário aconselhará a oração ou a
leitura de um bom livro que os possa ajudar. Fale-lhes do amor de Deus e da maternidade
de Maria, o que lhes servirá de conforto e de estímulo. Podem utilizar-se, de modo
semelhante, com proveito, os períodos freqüentes de provação na vida dos não-católicos
(doença, morte na família, etc.), mas, infelizmente, não se faz caso disso. A religião é tabu.
Os sentimentos mundanos por nós expressos não consolam, não manifestam a fé, nem farão
qualquer bem. Que os legionários aproveitem estas excelentes oportunidades de
aproximação. Quando, em tais circunstâncias, as barreiras normais são tiradas, as pessoas
rece-
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 313]
bem com reconhecimento palavras de conforto espiritual capazes de produzir muitos frutos.
e) Em muitos lugares se estabeleceu já o costume de um dia de retiro para nãocatólicos.
O programam compreenderá: missa, três conferências, uma sessão com discussão
livre dos assuntos que os retirantes propuserem, almoço, chá, Bênção do Santíssimo, e, por
vezes, um filme comentado por pessoa capaz. Se, para o retiro, se conseguir uma Casa
Religiosa, teremos um ambiente ideal, que muito contribuirá para desfazer falsas idéias e
preconceitos sobre a Igreja Católica.
Eis como se tem feito, nesta matéria, até o presente: fixa-se um dia para o retiro, e
imprimem-se os cartões de convite com o horário no verso. Estes são apresentados aos nãocatólicos
pelos legionários do bairro ou por outras pessoas, a quem se pede ajuda e a quem
se explica o objetivo do retiro. Não se esqueçam de usar de psicologia para obter melhores
resultados. De forma nenhuma devem ser distribuídos indiferentemente, como se fossem
simples avisos. Tenham uma lista das pessoas a quem entregaram os cartões, e procurem
verificar, depois, se foram realmente distribuídos. Os convites devem ser dirigidos só às
pessoas que ofereçam alguma esperança de os aceitar.
Ao receber o cartão, o legionário ou outra pessoa aceita o encargo de encontrar um
voluntário para o retiro. Enquanto não conseguir, o cartão em seu poder é uma prova de
acusação e, ao mesmo tempo, a lembrança evidente de um encargo não cumprido.
É costume cada não-católico ser acompanhado pelo amigo católico que serviu de
intermediário para o trazer ao retiro. O propósito de semelhante medida é levar o nãocatólico
a sentir-se em família durante os exercícios espirituais, responder a qualquer
pergunta e animá-lo a recorrer ao sacerdote no curso do dia. O silêncio não é obrigatório.
Os retiros estão abertos quer a homens quer a senhoras. Devem manter-se na sua finalidade
própria, excluindo, por conseqüência, tanto os convertidos como os católicos negligentes.
Quanto mais numerosos forem os convidados, maior será o número dos retirantes;
quanto maior for o número destes, maior será o número dos que entram no seio da Igreja. A
experiência já comprovou que existe uma proporção entre os diversos elementos desta
seqüência. Por conseguinte, a duplicação do número inicial de convites, que esteja
claramente dentro das nossas possibilidades, duplicará o número de conversões.
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 314]
“Que todos sejam um só. Como tu, ó Pai, estás em mim e Eu em Ti, que também
eles estejam em nós.” (Jo 17, 21)
“Ponde de lado a contribuição da Santíssima Virgem para o testemunho evangélico,
apagai o seu testemunho do Cristianismo, e verificareis que não se trata apenas de um elo
partido, mas da falta do eixo em que girava a cadeia inteira; que não se trata de um buraco
ou de uma fenda no edifício, mas da ruína dos próprios alicerces. A fé de todas as idades e
de todos os povos nos prodígios da Encarnação assenta num só testemunho, numa só voz –
o testemunho de Maria!”. (Cardeal Wiseman: As Ações do Novo Testamento)
5. A SAGRADA EUCARISTIA, INSTRUMENTO DE CONVERSÃO
Muitas vezes, perde-se muito tempo com argumentos e discussões que, mesmo
tendo algum proveito, não conseguem atrair as pessoas ao seio da Igreja. Quando
discutimos, deveríamos ter sempre como propósito levar os de fora da Igreja a perceber as
riquezas incalculáveis que ela encerra. Ora, não há meio mais eficaz para conseguir tal
finalidade do que apresentar a doutrina católica da Eucaristia.
Mesmo aqueles que conhecem Jesus, ainda que de modo confuso e imperfeito, Lhe
rendem uma profunda admiração. Baseados apenas no testemunho humano, confessam que
Ele exerceu um poder sem igual sobre a natureza: obedeceram-Lhe os ventos e as águas
revoltas; os mortos ressuscitaram; e as doenças desapareceram de forma completa. E tais
maravilhas operou-as Jesus Cristo por Sua autoridade e poder, pois, além de ser homem,
Ele era o Deus Eterno, Criador de todas as coisas, cuja palavra é onipotente.
As Sagradas Escrituras contam-nos como, em certa ocasião, o Homem Deus – entre
muitos outros inumeráveis prodígios – operou o milagre suavíssimo da Eucaristia. “Jesus
tomou o pão, benzeu-o, partiu-o e deu-o a seus discípulos, e disse: Tomai e comei, isto é o
meu Corpo” (Mt 26, 26). Eis as poderosas palavras da Escritura, cujo sentido muitos não
compreenderam. “Dura é esta linguagem e quem a pode ouvir?” (Jo 6, 60). A dúvida, que
brotou dos lábios de alguns dos próprios discípulos de Jesus Cristo, ecoou pelos séculos
afora, causando às pessoas um prejuízo imenso: “Como pode este homem dar-nos a comer
a sua carne?” (Jo 6, 52).
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 315]
Quase se podia perdoar a estes discípulos a sua incredulidade: não haviam
compreendido a verdadeira natureza da pessoa que se encontrava no meio deles. Que
sombra, porém, irá escurecer as inteligências daqueles que reconhecem a divindade e,
portanto, a onipotência de Jesus Cristo? Dirigir-se a gente simples, de modo solene, e dizerlhes:
“Isto é o meu corpo”, para significar precisamente o contrário: “Não, isto não é o meu
corpo” – não seria uma farsa, e, por conseqüência, uma atitude impossível para uma Pessoa
Divina? Conformem-se, então, com a lógica implacável de Pascal: “Como eu detesto os
que não crêem na Eucaristia! Se o Evangelho é verdadeiro, se Jesus Cristo é Deus – que
dificuldade pode haver em acreditar?”
É impossível apresentar aos homens a doutrina prodigiosa da Eucaristia, sem
despertar vivamente a sua atenção. Mostrar bem alto e com persistência, diante dos olhos
de nossos irmãos separados, esta glória da Igreja, é forçá-los a considerar a sua
possibilidade, e muitos deles, pessoas sinceras, hão de dizer de si para consigo: “Se isto é
verdadeiro, que imenso dano eu sofri até o presente!” E com a angústia deste pensamento
virá o primeiro impulso sério para o verdadeiro lar.
Fora da Igreja, numerosas pessoas lêem as Escrituras e, por meio da meditação e
oração fervorosas, esforçam-se por arrancar a figura admirável de Jesus às sombras do Seu
passado histórico; enchem-se de alegria quando, em imaginação, conseguem criar um
quadro vivo do Divino Mestre entregue às Suas obras de amor. Oxalá essas pessoas
entendessem que na Igreja Católica existe a maravilha da Eucaristia, capaz de introduzir na
esfera das suas vidas diárias o mesmo Jesus, todo inteiro, na realidade da Sua natureza
humana e divina. Se elas soubessem que por este meio O poderiam tocar, falar-Lhe,
contemplá-lO e ocupar-se d’Ele mais de perto, mais intimamente do que os Seus amigos de
Betânia! E muito mais: comungando em união com Maria, poderiam dispensar com
generosidade ao Corpo Divino os amorosos cuidados de uma terna Mãe e, assim, de certo
modo, agradecer-Lhe plenamente tudo o que fez por cada uma delas. Basta com certeza
expor às multidões fora da Igreja o incomparável dom da Eucaristia para as levar a suspirar
pela Luz. A este anseio responderá Jesus, dando-lhes a compreensão das coisas que Lhe
dizem respeito. E, como aos discípulos de Emaús, as Suas palavras divinas hão de abrasar
os corações, esclarecendo-os sobre o significado desta “expressão dura”: “Tomai e comei:
isto é o meu corpo” (Mt 26, 26); e os seus olhos hão de abrir-se e reconhecê-lO na fração
do Pão Divino (Lc 24, 13-35).
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 316]
A fé na Eucaristia fará com que os mal-entendidos e preconceitos que adormeciam
as inteligências e dificultavam a contemplação das coisas celestiais se derretam como
flocos de neve aos raios de um sol ardente. E quem até então andava em trevas exclamará
com a alma a transbordar de alegria: “O que eu sei é que era cego e agora vejo” (Jo 9, 25).
“Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento é Maria recebendo, na sua qualidade
de dispenseira universal da graça, o pleno e absoluto domínio sobre a Eucaristia e sobre
os tesouros que ela encerra. Este Sacramento é o mais poderoso meio de salvação, o fruto
por excelência da redenção de Jesus Cristo. A Maria compete, por conseqüência, tornar
Jesus conhecido e amado na Eucaristia. A Maria pertence espalhá-la pelo mundo inteiro,
multiplicar as igrejas, implantá-las entre os infiéis e defender a Fé neste Sacramento
contra os heréticos e os ímpios. Obra de Maria é também preparar as pessoas para a
Comunhão, movê-las a visitar com freqüência o Santíssimo Sacramento e a velar
incessantemente diante d’Ele. Maria é a tesoureira de todas as graças que a Eucaristia
encerra: de todas quantas a este Sacramento conduzem e de todas as que deste
Sacramento dimanam”. (Tesnière: Mês de Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento)
6. AS POPULAÇÕES SEM RELIGIÃO
A falta de religião em grande escala é um enorme problema. Em muitos dos grandes
centros populacionais, encontram-se bairros inteiros católicos apenas de nome, com uma
vida em que a Missa, os Sacramentos e até a oração para nada contam. Investigações
recentes vieram mostrar que num centro de 20.000 habitantes só 75 eram católicos
praticantes; noutro caso, de 30.000 pessoas, 400 somente participavam da Santa Missa; e
num terceiro caso, de 900.000 apenas 40.000.
Com muita freqüência, em tais áreas a falta de religião agrava-se, alastra-se
tranqüilamente, sem que nenhum esforço seja feito para impedir-lhe o avanço. Dirigir-se
diretamente às pessoas, argumenta-se, seria inútil e provocaria mágoas ou poderia ser
perigoso! E, coisa incrível, tais motivos parecem convencer quantos acham normal que os
missionários vão até aos confins da terra, enfrentando perigos e, até, a própria morte.
O mais triste ainda é que, em semelhantes localidades, o clero está praticamente
impossibilitado de acercar-se diretamen-
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 317]
te das pessoas. Por uma terrível confusão de circunstâncias, a fúria da impiedade revolta as
suas vítimas contra os representantes de Deus que as pastoreiam e provoca a sua expulsão.
É então que se manifesta o excepcional valor da Legião. Representa o sacerdote e executa
os seus planos; e, no entanto, é do povo, vive a vida do povo e não pode ser isolada do
povo. Os maus nunca conseguirão destruir-lhe o trabalho ou atrapalhar-lhe a aproximação
das pessoas pela cortina espessa de mentiras, tecidas com tanta facilidade contra o clero e
os religiosos que vivem à parte.
“Que dará o Homem em troca da sua alma?” (Mc 8, 37). – Que esforços deverá
fazer o homem para salvar o próximo? Esforços supremos, sem dúvida, arriscando, se
preciso for, a própria vida. As grandes áreas sem religião devem ser evangelizadas com não
menos energia que os distantes países de infiéis. Será que devemos ignorar, por isso,
totalmente, os gritos que se levantam de todos os lados: “não tem remédio”, “perigoso”? De
modo algum! Possivelmente, há palavras que podem contribuir para o êxito e proteção dos
legionários. Mas nunca se há de permitir que os seus gritos paralisem o ataque. Para se
deslocarem enormes montanhas de malícia requer-se da nossa parte uma fé firme: fé
semelhante à de Santo Inácio de Loyola, cuja confiança em Deus era tamanha que estava
disposto a aventurar-se ao mar, em barco sem remos e sem velas.
E verificaremos que o legionário não terá de enfrentar o martírio, mas que o
aguardam assinalados triunfos. Quantas pessoas não esperam pelo seu primeiro apelo
direto.
Um método de aproximação. Em situações semelhantes às que foram comentadas
acima, em que as pessoas desconhecem os mais simples aspectos da vida cristã, os
legionários devem mostrar, em primeiro lugar, a necessidade da participação na Santa
Missa. Tenham em mãos, para isso, folhetos que expliquem em linguagem simples, a
beleza e o poder da Missa. Se o folheto tiver uma imagem colorida a ilustrar o assunto,
despertará maior interesse. Com este folheto, os legionários visitarão as famílias, casa por
casa, entregando-o a todas as pessoas de boa vontade. Hão de acompanhar este ato, onde
for possível, de um delicado incentivo sobre a participação no Santo Sacrifício. A atitude
dos legionários, inútil recordá-lo, deve ser sempre de uma infinita amabilidade e paciência,
sem perguntas curiosas ou repreensões de qualquer gênero.
317
[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 318]
As muitas recusas que de início poderão receber serão depressa compensadas por
êxitos numerosos e imediatos. As visitas serão feitas em conformidade com o método
legionário, tendo como propósito estabelecer relações amigas com as pessoas visitadas.
Conseguida esta finalidade, a partida estará quase ganha.
Cada conversão individual ou regresso à prática dos Sacramentos deve ser para os
legionários o que a conquista de uma posição estratégica inimiga é para os soldados em
tempo de guerra, pois que uma traz sempre outra consigo. À medida em que as conversões
se multiplicam, modifica-se a opinião pública. Na vizinhança todos têm os olhos nos
legionários: fala-se, critica-se, reflete-se, e os corações gelados começam a se aquecer. Os
anos vão passando um após o outro com numerosas conversões; e, com o passar do tempo,
a atitude geral do povo para com a religião pode parecer não ter sofrido mudança, – até que
um dia, acontece alguma coisa inesperada e percebemos que aquela resistência existente cai
por terra. E, então, como um tecido que parece em bom estado, mas está roído pelas traças,
os corações, que pareciam duros, de repente se voltam para Deus.
O resultado do esforço. – Numa cidade, calculada em 50.000 habitantes, poucos
católicos praticantes se encontrariam. Anormalidades de todo tipo vinham complicar o
estado de completa indiferença religiosa em que se vivia. O sacerdote que se aventurasse a
atravessar muitos dos seus bairros era infalivelmente insultado. Com grande espírito de fé,
fundou-se ali um Praesidium; e, embora os esforços parecessem inúteis, iniciaram-se as
visitas legionárias a domicílio. Surpreenderam os resultados imediatos, que foram
aumentando em número e importância à medida em que os legionários se multiplicavam e
adquiriam experiência. Depois de três anos de inesperados triunfos, as Autoridades
Eclesiásticas atreveram-se a convocar os homens para uma comunhão geral, esperando, na
melhor hipótese, reunir uns 200. Ora, os comungantes elevaram-se a 1.100, sinal evidente
de que a população havia sido profundamente sacudida por três anos de apostolado.
A vitória final está à vista e a nova geração nascerá numa ordem de coisas
completamente diferente. A piedade reinará onde outrora todos desprezavam a Santa Missa
e zombavam dos ministros de Deus. E por que é que outros centros populosos, que sofrem
dos mesmos males, não se utilizam do mesmo remédio?
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo
[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 319]
“E Jesus, respondendo, disse-lhes: ‘Tende fé em Deus. Em verdade vos digo que
todo o que disser a este monte: sai daí e lança-te no mar, e não hesitar no seu coração,
mas acreditar que o que diz vai se realizar, tudo o que disser será feito. Por isso vos digo:
todas as coisas que pedirdes, orando, crede que as haveis de conseguir e obtê-las-eis.’”
(Mc 11, 22-24)
7. A LEGIÃO, AUXILIAR DO MISSIONÁRIO
Situação Missionária
Por Atividade Missionária, queremos significar aqui todo o trabalho apostólico
dirigido a pessoas e grupos que ainda não conhecem Jesus Cristo ou não acreditam n’Ele,
entre os quais a Igreja não lançou raízes ou cuja cultura não foi tocada pelo Cristianismo.
Importam tomar consciência de que entre os povos a serem evangelizados existem
grandes diferenças, a nível de cultura, de educação e de condições sociais. Mesmo dentro
das fronteiras de uma nação, podemos encontrar cidades muito povoadas e comunidades
rurais dispersas. Haverá certamente diferenças entre ricos e pobres, entre pessoas de
elevada cultura e analfabetos, entre raças e línguas.
O número global das pessoas que não conhecem Jesus Cristo cresce mais
rapidamente que o número de crentes.
É neste vasto campo que atua o missionário – sacerdote, religioso ou leigo. Vindo
de fora, é brecado na sua ação pela diferença de raça, de língua e de cultura. A experiência
e a preparação podem facilitar o trabalho, mas dificilmente remover os obstáculos.
Num território aberto pela primeira vez ao trabalho apostólico, a sua tarefa consiste
em fundar comunidades cristãs locais que, depois de crescerem e de se tornarem Igrejas
auto-suficientes, se convertam em centros de irradiação missionária.
Inicialmente, o missionário procurará criar rapidamente uma rede de contatos e de
amigos. Onde for possível, há de estabelecer os serviços necessários – escolas, clínicas
médicas, etc. – para testemunhar a fé cristã e facilitar os contatos. Entre os convertidos,
selecionará os catequistas e outro pessoal da Igreja.
O missionário e o catequista local podem instruir apenas aqueles que desejarem ser
instruídos. Criar este desejo é, propriamente falando, converter. Abaixo de Deus, este
desejo surge
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 320]
normalmente do contato com um leigo católico, e, mais tarde, com o sacerdote. É um
crescimento gradual na amizade e confiança. “Venho falar com Vossa Rev.ma porque
conheço um católico”, costumam dizer, os interessados, ao sacerdote.
Ao missionário aflito, a Legião oferece-se como instrumento provado para cativar
convertidos e garantir a sua perseverança. Membros de uma comunidade local, tendo
inicialmente o missionário como Diretor Espiritual, os legionários instruirão, formarão e
levarão os neo-convertidos a evangelizar contínua e metodicamente. Não vêm de fora,
como o missionário. Vivem no local para, com a devida formação, atuarem como luz, sal e
fermento da comunidade, como os primeiros cristãos.
Desenvolvimento da Legião
À medida em que o número e a qualidade dos legionários crescerem, será
necessário, para garantir o treino conveniente, aumentar o número de Praesidia. Talvez
cada um dos sacerdotes possa assumir a direção espiritual de mais de um grupo. Lance-se
mão, se possível, de catequistas e outras pessoas com experiência, como presidentes, para
treinar e animar os Praesidia. Cada novo Praesidium serão mais dez a vinte soldados da fé
em ação.
O bom êxito de semelhante política de multiplicação dos Praesidia fará, com o
tempo, que cada sacerdote possa organizar as atividades de numerosos trabalhadores
apostólicos. Cada pároco desempenhará então, no campo que lhe foi confiado, funções
semelhantes às do Bispo na sua diocese. Quanto ao bispo, estará na posse de uma
numerosíssima e irresistível fileira de trabalhadores pela fé. Com eles e através deles
poderá pregar o Evangelho a todas e cada uma das pessoas do território de que é
responsável.
O que aqui se propõe não é um plano imaginário, mas o fruto de numerosos anos de
frutuosas experiências de evangelização nas terras de missão, sob as mais variadas
condições.
Um dever concreto para cada legionário
A todo legionário se dará uma tarefa bem definida. Examine-se o conjunto da tarefa
a ser realizada e então dividam-se as tarefas e responsabilidades. Cada um terá a sua e será
responsável por seu cumprimento. Faça-se compreender aos legionários que, na realização
dos seus trabalhos apostólicos, se colocam ao
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 321]
serviço do sacerdote. Através deste, estão em comunhão com a Igreja. Um dos principais
objetivos do sistema da Legião será convencer cada legionário desta responsabilidade e
prepará-lo para a cumprir honrosamente.
Entre os trabalhos que os legionários podem convenientemente assumir nas
situações missionárias, assinalemos os seguintes:
a) preparar as visitas periódicas do missionário a postos isolados;
b) instruir os catecúmenos, procurar novos candidatos e animá-los a uma assistência
regular;
c) estimular os católicos descuidados e os indecisos a voltarem à perfeita prática da
fé;
d) orientar as funções paralitúrgicas;
e) atuar como Ministros Extraordinários (da Eucaristia, etc.);
f) cuidar das necessidades espirituais dos moribundos e do seu posterior funeral
cristão. As necessidades locais hão de sugerir outros exemplos de obras de misericórdia
espirituais e corporais.
Será necessário que os legionários sejam instruídos?
O grau de conhecimento religioso exigido depende do trabalho apostólico
solicitado. Para converter e animar os convertidos a perseverar, basta um conhecimento das
bases da fé. O rápido crescimento da Igreja nos primeiros tempos do cristianismo é um
exemplo claro disso. Em muitos casos, as conversões foram operadas por membros
humildes, fracos e oprimidos da sociedade poderosa, rica e letrada em que viviam. Não se
trata, evidentemente, de uma instrução metódica propriamente dita, que é sempre
necessária, mas do esforço de um coração para derramar em outro coração o dom supremo
que possui. Isto acontece plenamente quando se trata de igual para igual, mas a experiência
mostra que as barreiras sociais podem ser ultrapassadas com facilidade.
Por mais imperfeitos que sejam os seus conhecimentos religiosos, todo
católico convicto forma uma certa idéia da sua fé e é capaz de a comunicar a outra
pessoa, a quem procure influenciar. Para exercer essa capacidade, porém, precisa da
força de uma organização ou de outro forte impulso. O sistema legionário comunica
essa força capaz de nos pôr em ação, apresentando uma motivação e um trabalho
concreto de caráter apostólico a fazer. Em virtude da formação recebida, o
legionário, por sua iniciativa, é capaz de estar atento às oportunidades de comunicar
a sua fé.
A Legião é Maria em atividade. – Introduzir a Legião é aplicar à obra das Missões duas
fontes de energia: a) o princípio
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 322]
de uma organização metódica, que traz consigo um aumento de interesse e de eficiência; b)
e o elemento poderosíssimo da influência maternal de Maria, que a Legião atrai em
plenitude pelo seu sistema marial, e derrama nas almas mediante o seu apostolado intenso.
Na verdade, sem a união com Maria, é impossível a propagação da Fé. Esforços, a que ela
não presida, são como azeite sem lâmpada. Não estará, porventura, na insuficiente
valorização desta verdade o motivo de serem poucos os magníficos triunfos da Fé, em
nossos dias? Nos primeiros séculos do Cristianismo, convertiam-se rapidamente nações
inteiras; e São Cirilo não hesitava em declarar no Concílio de Éfeso que todas as
conversões a Cristo eram obra de Maria. O grande Padroeiro das Missões, S. Francisco
Xavier, apelando para a sua experiência pessoal atestava que, onde não colocara aos pés da
cruz do Salvador a imagem de Sua Divina Mãe, os habitantes tinham acabado por se
revoltar contra o Evangelho que lhes levara.
Em suma: se a frutuosíssima influência de Maria pudesse exercer-se nos países de
missão através do apostolado legionário, por que não haveríamos de esperar o retorno dos
dias gloriosos de que fala São Cirilo, em que nações e territórios inteiros, abandonando os
seus erros, abraçariam alegremente a Fé cristã?
“Que presunção louca ou sublime e celeste inspiração se apoderou destes humildes
pescadores! Considerai por um instante a sua arrojada empresa! Nunca príncipe, império
ou república concebeu mais elevado desígnio. Sem possibilidade alguma de auxílio
humano, partilham entre si a conquista do mundo. Decidem substituir as religiões
estabelecidas em toda a terra, as falsas ou as verdadeiras em parte, tanto entre os gentios
como entre os judeus. Querem fundar um novo culto, um novo sacrifício, uma nova lei,
porque, dizem eles, um certo homem crucificado em Jerusalém assim o ordenou.”
(Bossuet)
8. PEREGRINAÇÃO POR CRISTO – P.P.C.
O desejo de travar contato com cada uma das pessoas deve começar por aqueles que
estão ao nosso alcance. Porém, não deve parar aí, mas avançar, por passos simbólicos, para
além da esfera da vida normal. Um tal propósito é facilitado pelo Movimento legionário
conhecido por Peregrinação por Cristo (P.P.C.). Este nome deriva do heroísmo missionário
dos Mon-
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[Capítulo 40 Ide por Todo o Mundo e Pregai o Evangelho página 323]
ges do Ocidente, imortalizados na obra clássica de Montalembert. Essa multidão invencível
“deixou a sua terra, a sua família e a casa de seus pais” (Gn 12, 1) e cruzou a Europa nos
séculos sexto e sétimo, reerguendo a fé que o desabamento do Império Romano arrastara
consigo.
Com o mesmo idealismo, a Peregrinação por Cristo envia grupos de legionários,
que dispõem de tempo e meios, a lugares distantes, onde as condições religiosas são más,
para ali exercerem, durante um período limitado de tempo, “a missão delicada, difícil e
impopular de revelar que Cristo é o Salvador do Mundo, missão essa de que o povo se deve
encarregar” (Paulo VI). Os lugares próximos não são próprios para a peregrinação. Se
possível, deveria fazer-se em um país diferente.
A afirmação do princípio de viajar e correr aventuras pela fé, mesmo por pouco
tempo – uma ou duas semanas –, pode transformar a mentalidade legionária e impressionar
vivamente a imaginação de todos.
9. MISSIONÁRIOS DE MARIA
Há corações generosos, no entanto, que em muitos casos não se contentarão com dar
uma semana ou duas, mas desejam oferecer um período mais longo de serviço legionário,
longe da terra natal. Os legionários que possam garantir um meio de subsistência no lugar
previsto e ausentar-se seis meses, um ano ou mais, sem prejudicar a família ou outros
compromissos, podem ser designados pelo Concilium, Senatus ou Regia, por um período
conveniente, para um tal encargo missionário. Para isto, requer-se, sem dúvida, o concurso
das autoridades do lugar previsto.
Estes voluntários são conhecidos por Missionários de Maria, expressão que denota a
sua permanência transitória num lugar distante, animados por um espírito de sacrifício por
Maria.
10. JORNADA APOSTÓLICA
Jornada Apostólica é a expressão usada para designar o que poderíamos chamar
uma mini-Peregrinação.
Cada Praesidium é convidado, se possível como grupo, a consagrar ao menos um
Domingo por ano a uma campanha num
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[Capítulo 40 “A maior das Três é a Caridade” página 324]
lugar – possivelmente numa área com problemas – a pequena distância, nunca tão longe
que se tenha de gastar tempo excessivo na viagem. A Jornada pode ir além de um dia;
talvez seja possível dedicar-lhe dois ou três.
A Jornada Apostólica possibilita à maioria dos membros (em muitos casos, a todos)
lançar-se numa tal aventura. Está provado que, mesmo com a melhor boa vontade, a
Peregrinação por Cristo não é possível à maioria dos legionários.
O Concilium Legionis já chamou a atenção, repetidas vezes, para um ponto e a
experiência revela que se torna necessário insistir nesse mesmo ponto: a Jornada Apostólica
é essencialmente um projeto do Praesidium. Pede-se aos Conselhos e Praesidia que tenham
isto presente ao tratar da organização da Jornada.

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